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Trecho de PL do 'ECA Digital' pode dar novo poder à Anatel, alertam entidades

Coalizão Direitos na Rede pede veto a emenda que amplia atuação da agência na governança da internet sem passar por debate público

A Coalizão Direitos na Rede pede, em nota pública, que os parágrafos 6º e 7º do artigo 35 do PL 2628/2022, conhecido como "ECA Digital", sejam vetados pelo presidente Lula quando da sanção do projeto para que vire lei.

De acordo com as mais de 50 entidades, os trechos dão novos poderes à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) que não fazem parte das suas prerrogativas de atuação das infraestruturas e serviços de telecomunicações.

O texto do PL prevê que, após decisão judicial, caso o infrator não a cumpra, a agência execute a ordem de bloqueio dirigida "às prestadoras de serviços de telecomunicações que proveem conexão à internet, entidades gestoras de pontos de troca de tráfego de Internet, prestadores de serviços de resolução de nomes de domínio e demais agentes que viabilizem a conexão entre usuários e servidores de conteúdo na internet".

E também que a Anatel defina a técnica mais adequada para implementação do bloqueio.

Esses parágrafos foram incluídos no projeto por meio de uma emenda do deputado federal Julio Cesar Ribeiro (Republicanos-DF) durante a votação do PL na Câmara dos Deputados, em 20.ago, e acabou passando despercebido.

Ribeiro é presidente da Comissão de Comunicação na Câmara e, nesta terça-feira, 2.set, assinou um requerimento em que pede explicações à ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, que teria recomendado ao presidente Lula para vetar o trecho.

O próprio presidente da Anatel, Carlos Manuel Baigorri, admitiu ao UOL na segunda-feira, 1.set, os esforços de pautas de interesse junto a parlamentares.

O problema é que a autarquia não é responsável por nomes de domínios (os endereços de sites, por exemplo o do Núcleo é www.nucleo.jor.br) nem por pontos de troca de tráfego da internet (pontos em que as redes se cruzam) pois esses são serviços de internet e não de telecomunicação, explica Bia Barbosa, integrante da Coalizão e uma das representantes da sociedade civil no Comitê Gestor da Internet (CGI.br).

"Telecomunicações são os cabos, as antenas, a infraestrutura por meio da qual os pacotes de dados da internet são transmitidos", aponta. "Já a internet é a camada lógica, dos protocolos, e a camada de conteúdos, onde está a web, o www, e vários serviços que que não são de telecomunicações, portanto, não cabe por lei a Anatel regular nem gerenciá-los".

Quem faz o registro dos domínios com final .br é o Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), responsável por implementar ações do CGI.br e, se acionado pelo poder judiciário, também pode executar o bloqueio do endereço de um site.

Para as entidades, essa parte do PL pode prejudicar a governança da internet no Brasil uma vez que a agência é um autoridade de execução e não de debate sobre a formulação de diretrizes relacionadas ao uso e desenvolvimento da internet no Brasil, como é o caso do CGI.br que é composto por representantes de diversos setores, inclusive do governo, do empresariado, do terceiro setor e da comunidade científica, por exemplo.

"O debate precisa acontecer de uma maneira ampla e não por meio de uma emenda aprovada nos 48 minutos do segundo tempo", critica Barbosa.

Ela sinaliza que o texto também pode inviabilizar a previsão de criação de uma autoridade administrativa autônoma que será responsável por fiscalizar o cumprimento do ECA Digital.

O Núcleo procurou a assessoria da Anatel sobre a nota da Coalizão Direitos na Rede, mas até a publicação não houve resposta.

Texto Jeniffer Mendonça
Edição Alexandre Orrico
Jeniffer Mendonça

Jeniffer Mendonça

Jornalista especializada na cobertura de segurança pública e direitos humanos. Possui pós-graduação em Estudos de Criminalidade e Segurança Pública pela UFMG. Por sete anos, foi repórter da Ponte Jornalismo.

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